terça-feira, 25 de setembro de 2012

Retirado do Blog da Maria Angelica


Autor: Walter Falceta Jr.



Ontem, por ocasião dos debates em torno das declarações do "sabe-tudo" Emir Sader, o colega Thales Migliari nos brindou com a foto em que a torcida corinthiana desafia os tiranos militares e exibe uma faixa em favor da Anistia Ampla Geral e Irrestrita.



Essa imagem costuma frequentar os debates sobre futebol e política, mas pouca gente conhece os segredos dessa intervenção histórica, ocorrida em 1979, ainda na vigência da Ditadura.



O protagonista do caso é o CORINTHIANO Antonio Carlos Fon, jornalista respeitado e ético, que ganhou os principais prêmios brasileiros da categoria, como o Esso e o Vladimir Herzog.



Mestiço do mundo, Fon é 50% chinês, por contribuição do pai. Pela parte da mãe, tem 25% de sangue índio, 25% de sangue africano.



Foi membro da Aliança Libertadora Nacional, participando ativamente da resistência à Ditadura. Era apelidado de "pequeno grande guerreiro", por ser baixinho, magrinho e destemido.



Foi preso, torturado e respondeu a processo instaurado com base na famigerada Lei de Segurança Nacional.



Foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT) e presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo, no início da década de 1990.



Abaixo, numa fusão de dois depoimentos, um deles para a Fundação Perseu Abramo, ele conta, com suas próprias palavras, como a resistência democrática e a Fiel marcaram um gol de placa contra a repressão:



“ Em 1979, nós parentes e amigos de perseguidos políticos, tínhamos fundado o Comitê Brasileiro pela Anistia.



Mas, a palavra de ordem anistia estava muito restrita aos intelectuais, setores mais politizados e aos familiares e discutíamos muito como levar isso para o povo.



Um dia eu estava conversando com o Chico Malfitani que trabalhava comigo na Veja, e disse para ele: ‘O que precisamos mesmo é levar a palavra de anistia para a torcida do Corinthians, para o povo’.



O Chico era um dos pioneiros da Gaviões e disse: ‘Vamos fazer’. Combinamos fazer isso num jogo Corinthians e Santos.



No dia, o Chico teve um problema familiar e chegou um pouco mais tarde, mas nós entramos, conversamos com o pessoal com quem ele tinha acertado e avisamos somente uma pessoa na imprensa: Osmar Santos, que era um locutor esportivo mais conhecido e de esquerda, ligado às lutas democráticas.



E o Osmar Santos, anunciou: ‘A Gaviões vai fazer uma surpresa quando o time entrar em campo’. E isso levou todas as outras rádios, emissoras de TV e jornais a ficar esperando.



Na hora em que o time entrou, muitos fogos, aquela fumaça... E abrimos a faixa. Na hora que a fumaça baixou estava lá: Anistia Ampla, Geral e Irrestrita.



Quase todo mundo fotografou e isso foi para o Brasil inteiro. E realmente conseguimos o objetivo; só que a PM tentou subir para nos prender.



Quando a polícia começou a subir os degraus da arquibancada, os torcedores da Gaviões da Fiel deram-se os braços e fecharam o caminho.



Os soldados da Polícia Militar ainda tentaram forçar a passagem mas, nas fileiras de trás, milhares de outros corinthianos, braços dados, formando uma massa compacta, começaram a gritar, ameaçando descer as escadarias do estádio do Morumbi.



O comando do policiamento deve ter avaliado a situação e dado uma contra-ordem, porque os PMs recuaram, desistindo de chegar até nós.



- "Eles estavam falando da nossa faixa"- dizia um torcedor ao meu lado, rádio de pilha colado no ouvido, boné e camiseta do Corinthians e um sorriso nos lábios.



Eu jamais o vira antes e nem o encontrei depois, mas nunca o pronome possessivo na primeira pessoa do plural (nossa) me pareceu tão saboroso.



- "Anistia, ampla, geral e irrestrita" – dizia a faixa, e o fato dele a chamar de "nossa" tinha, para mim, pelo menos, um significado que ultrapassava em muito aquela fugaz solidariedade que se estabelece nos campos de futebol entre torcedores do mesmo time: a bandeira era minha e da torcida do Corinthians.



Só que o outro companheiro que tinha levado a faixa, Carlos MacDowell, era santista e ele disse: ‘Fon, não vou ficar assistindo o jogo aqui na torcida do Corinthians. Vou assistir da torcida do Santos’.



Ele desceu e a PM o prendeu. Ele ficou preso pouco tempo, porque já tínhamos um esquema com o advogado Luís Eduardo Greenhalg, que o liberou no DOPS.



O engraçado, é que tive que fazer uma matéria para a Veja e ir ao DOPS para entrevistar o Edsel Magnotti, delegado titular que era quem prendia e torturava a gente.



E aí ele demorou um pouco para me receber. Quando entrei, atrás da mesa dele estava uma ampliação enorme da faixa e eu lá, segurando ela. Era aquela coisa, como se ele tivesse dizendo: ‘Olha aí seu filho da mãe, eu sei que foi você’."



* Naquele jogo, realizado no Morumbi, com público de 108 mil pessoas, Sócrates abriu o placar, aos 26 do primeiro tempo, mas João Paulo empatou para o Santos, 11 minutos depois.



O segundo tempo foi duramente disputado e já se imaginava um empate. Aos 36 minutos do segundo tempo, no entanto, Palhinha marcou e decretou mais uma vitória corinthiana.



Naquele ano, o Corinthians foi campeão mais uma vez!



Crédito do texto e de imagem

Walter Faceta Júnior/ facebook.com/groups/brigadamiguelbataglia

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