quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Blog do Rafael Castilho Um espaço para os espíritos livres!

Manifesto ao manifesto dos jogadores do Corinthians



Manifesto de um torcedor comum aos jogadores do Corinthians

Senhores jogadores, antes que imaginem que me identifico como um torcedor comum em oposição aos torcedores organizados, gostaria de dizer que não se trata disso.

Fico feliz que vocês estejam se organizando em movimentos de paralisação ou mesmo na produção deste manifesto.

É certo, portanto, que vocês entenderam a importância da livre associação e da força oriunda da união entre as pessoas que compartilham os mesmos interesses e objetivos. Certamente todos ficam muito mais fortes e as vitórias mais próximas e possíveis.

Ainda que haja um grande proveito a partir da organização dos jogadores, logo vocês perceberão que não estarão livres dos erros e que não conseguirão ser responsáveis pelas diferentes expressões das partes que desejam falar pelo todo. Mas sem pressa. Isso vocês entenderão com o tempo.

De fato, não faço parte de nenhuma torcida organizada do Corinthians. Não porque eu seja contra a organização destas. A marginalização das torcidas, não é somente fruto doserros imperdoáveis de alguns de seus integrantes. Acredito que se esta sociedade fosse tão intolerante com a violência, não viveríamos tropeçando em cadáveres todos os dias. Se quiséssemos realmente uma sociedade menos violenta teríamos construído um país mais justo ao longo dos séculos. Sobretudo com as pessoas mais pobres das periferias que são esmagadas todos os dias, seja através das balas, seja no vai e vem cotidiano em trens e ônibus superlotados. Em filas de hospitais e sem ter a quem recorrer. Mas isso vocês devem saber. A grande maioria de seus colegas tem origem entre os pobres deste país.

O que incomoda de fato nas torcidas organizadas é a ameaça da construção dos sistemas de solidariedade entre os indivíduos.

Quando alguns tolos se perdem em brigas e emboscadas, isso serve de combustível para o show de horror dos jornais sensacionalistas.

Espero que “os caras” descubram a tempo que há na verdade um processo de elitização do futebol. Que eles estão prestes a serem varridos dos estádios. E quando digo “eles” estou me referindo aos pobres. Não sou tão otimista, mas caso eles não acordarem rápido e pararam de digladiar uns com os outros e percebam que independente da camisa que vestem compõem em sua grande maioria a mesma classe social, perderão o acesso à experiência maravilhosa que é curtir uma partida de futebol, algo absolutamente ligado à cultura do povo brasileiro.

Sei que isso não é problema de vocês craques, mas não são somente os torcedores marginalizados. Professores, sindicalistas, manifestantes, blocos de carnaval, movimentos sociais, usuários insatisfeitos da CPTM. Todos estão no mesmo balaio do crime organizado, da cracolândia e do vandalismo. Fazem parte do mesmo caldo chamado “sociedade”. Algo que os conservadores não entendem muito bem como funciona e assim preferem destruir evitando uma possível sabotagem aos donos do poder.

Pois bem, vocês se organizaram e aqui estão manifestando-se pela segurança e integridade física de vocês e de suas famílias.

Nada mais justo. As ameaças e ataques são recursos que revelam a imaturidade de alguns indivíduos frente ao diálogo e a interlocução. Temos que dar um salto a diante. Superar essa condição. Aprender a usufruir de novos recursos e ferramentas de comunicação e representação.

Se o manifesto de vocês tem como objetivo combater a violência e reivindicar garantias de segurança para os jogadores e funcionários, está tudo de muito bom tamanho. Deveríamos inclusive aplaudir a atitude de vocês.

Mas espero do fundo do coração que o objetivo seja somente esse. Que não esteja embutida uma intenção de “enquadrar” a torcida do Corinthians e fomentar o insolidarismo entre nós. Que não queiram tirar da gente aquilo de mais precioso e genuíno da nossa história, que é justamente a participação.

Sei que pode parecer um inconveniente para um profissional bem remunerado do futebol, mas caso vocês não saibam, a participação da nossa torcida não se restringe aos aplausos ou eventuais vaias nas arquibancadas cada vez menores e nas numeradas cada vez maiores.

Construímos um clube popular, fruto de um pacto que envolve  a participação, a fiscalização e empoderamento deste povo que efetivamente fez o Corinthians.

O que para vocês é um emprego, para nós é a coisa mais linda que habita no nosso coração. A lembrança mais doce e ingênua da nossa infância. A memória dos nossos pais que se foram. Ou mesmo dos pais que não tivemos.

O que para vocês é trabalho, para nós é voluntarismo. Se vocês são profissionais do Corinthians, nós somos amantes. Vivemos uma relação de amor vagabundo e indecente com o Corinthians.

O Corinthians não é o Parque São Jorge, o Centro de Treinamentos ou o Itaquerão. Nós somos o Corinthians. Isso mesmo! Essa gentalha que lhes parece esquisita. A maloqueirada. Os apaixonados. Somos também empresários, lavadores de carro, bancários, vagabundos, trabalhadores que pegam todos os dias o transporte público ou o trânsito lotado sonhando em pagar a faculdade dos filhos, para que eles tenham uma vida mais digna, porém jamais virando as costas para o Corinthians.

Li o manifesto e percebi que vocês se ressentem dos últimos resultados dentro de campo. Deixem isso pra lá! Vocês não entenderam nada! Ser for isso tudo bem...

Não se trata de resultado. Que percam mais dez, vinte ou mil jogos. Seguiremos lotando os estádios e apoiando o Corinthians. Crescemos e nos tornamos mais fortes nos 23 anos sem títulos. Basílio é um padroeiro por ter empurrado aquela bola pro fundo do gol. E tanto faz se era Paulistinha, Paulistão, Libertadores ou Mundial. Era o Corinthians das nossas vidas.

Quando o Corinthians joga o Campeonato Paulista contra um Bragantino da vida, não sentimos vontade de ir à praia conforme disse o nosso intelectual de sorveteria, capitão Paulo André. Na verdade, nós cancelamos a praia, a festa, a balada, o encontro e talvez até o casamento para ver o jogo do Coringão.

Talvez seja essa a nossa dificuldade de comunicação.

O Corinthians está dentro da gente. E o que mantém ele preso aqui dentro do nosso peito, no imaginário coletivo, é justamente a identidade.

Na medida em que o Corinthians se converte numa confraria de senhores bem estabelecidos, acomodados com o recente sucesso, desfrutando as delícias das luxúrias em noites intermináveis, vocês afastam o Corinthians da gente.

Quando vocês se perdem num concurso de vaidade que salta aos olhos de todos, vocês afastam o Corinthians da gente.

Quando nossos mandatários ficam satisfeitíssimos de si por suas grandes obras e constroem novos prédios onde se supõe que talvez não possamos entrar, isso afasta o Corinthians da gente.

E vocês não têm noção dessa violência. É arrancar sem anestesia o nosso coração à unha.

Outra vez para que fique claro: a violência não dá pé. Foi tudo precipitado e feito dojeito errado. Mas espero que vocês não façam parte de um jogo sujo e tentem chantagear a torcida do Corinthians. Não queiram tirar a pressão de seus ombros, esganando justamente a torcida.

Hoje pode parecer desejável que estejamos restritos às arquibancadas ou até mesmo afastados dos estádios. Mas cá entre nós, não foi legal quando abraçamos o elenco da porta do CT até o Aeroporto, simplesmente para dizer um “Vai com Deus Corinthians?”.

Não há fronteira entre nós e o Corinthians. Não há arame e cerca elétrica que nos separe.

Não somos um CNPJ, somos um movimento social. Daqui um tempo, todos estarão longe e a torcida permanecerá. Daqui uns anos, muitos de nós viveremos em outro plano, mas o Corinthians continuará existindo nos nossos filhos.

Fechamos assim: um pacto de respeito mútuo. A violência é inaceitável. Mas que vocês entendam de uma vez por todas O porquê do VaiCorinthians!

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