segunda-feira, 9 de abril de 2018

Xadrez do pós-Lula e o fator Ciro, por Luís Nassif O Jornal de todos Brasis Xadrez do pós-Lula e o fator Ciro, por Luís Nassif 874 SEG, 09/04/2018 - 00:50 ATUALIZADO EM 09/04/2018 - 08:29

Ponto 1 – o avanço do Estado de Exceção

Se havia alguma dúvida sobre o Estado de Exceção, deixou de existir no julgamento do habeas corpus de Lula.
Não se alimentem esperanças com novos habeas corpus, novas discussões sobre prisões em 2ª instância, qualquer atitude digna do STF (Supremo Tribunal Federal) reconhecendo direitos de Lula. O último julgamento demonstrou que a única lógica que vigora no STF é a da prisão e/ou impedimento eleitoral de Lula.
 A cena final, do Ministro Marco Aurélio espicaçando a presidente Carmen Lúcia, colocando a nu suas manobras processuais,  comprova que ela perdeu até o mais básico dos fatores de contenção: o pudor. Se, na próxima 4ª feira, Marco Aurélio de Mello conseguir colocar em votação a questão das ADCs (Ação Direta de Constitucionalidade) sobre prisão em 2ª instância, ou a Ministra Carmen Lúcia tem um ataque de pânico, ou alguém Ministro pede vista ou a douta Ministra Rosa Weber mudará de opinião, em cima de um novo voto escrito em puro javanês.
Aliás, a contra-ofensiva de Carmen Lúcia foi a de pautar o julgamento de habeas corpus de Antonio Palocci e Leo PInheiro. Como HCs têm prioridade, echa a pauta para o julgamento das ADCs. Ontem, os bravos juristas da Globonews não se cansaram de elogiar a esperteza de Carmen.
Os distintos Ministros rasgaram as respectivas becas e as posições de dignidade, por lá, sempre serão minoritárias.
Esse liberou geral decorre da crise do Executivo. Sem Executivo forte, abrem-se os portões dos estábulos e de potrinhos a cavalos velhos, todos saem derrubando as cercas e gozando da liberdade de um país com a Constituição pisoteada.

Ponto 2 – a inviabilidade da pax lulista

A grande contribuição de Lula à história, além do combate à miséria, foi a visão nacional de busca de consensos. Esse trabalho permitiu 10 anos nos quais o país avançou em políticas educacionais, tecnológicas, industriais, regionais, nas políticas sociais de ponta.
Trouxe lideranças empresariais de visão – como Luiz Furlan, Roberto Rodrigues -, diplomatas experientes, grandes formuladores de políticas sociais, movimentos sociais e, gradativamente, empurrou o governo para o centro-esquerda.
A polarização alimentada pela mídia explodiu esse consenso. Um Executivo extremamente fraco e ingênuo, conferindo autonomia total ao Ministério Público Federal, à Polícia Federal, descuidando-se do STF, do Judiciário, permitiu o avanço ilimitado das corporações. Elas simplesmente ocuparam o vácuo deixado pelo Executivo e ampliado pelo bate bumbo da mídia.
O primeiro passo para a volta da governabilidade, portanto, será recuperar o poder do Executivo. E, aí, sem a ingenuidade de supor ser possível recuperar o país sem conflitos políticos.

Ponto 3 – o papel restaurador das eleições e o caminho da governabilidade

Há dois desafios pela frente.
O primeiro, a garantia das eleições. Nos próximos meses haverá uma tentativa insana de diversos setores para adiar as eleições.
O segundo, a garantia da governabilidade.
Eleições têm o condão de resetar o HD institucional. O presidente sempre dispõe de poderes amplos, desde que saiba utilizá-los, especialmente em relação às corporações públicas que assumiram as rédeas do Estado.
Pela Constituição, Procuradores Gerais são demissíveis a qualquer momento; a lista tríplice para Procurador, uma invenção do próprio Ministério Público, não prevista na Constituição, certamente será abolida. Aliás, no site da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) fica claro qual o objetivo maior da lista tríplice: “O chefe do Executivo pode avaliar os anseios da carreira antes de repassar ao Senado Federal o nome do indicado”.
Com o fim da Lista Tríplice, os anseios da carreira voltarão a ser o de bem servir ao país e à Justiça, e a condenar as demonstrações vergonhosas de poder deslumbrado, de atos arbitrários de um poder que, por algum tempo, perdeu a noção de sua missão.
Um Ministro da Justiça com autoridade enquadra a Polícia Federal. Haverá um Congresso horroroso, mas manejável com um mínimo de habilidade política.
Há, enfim, a figura do Conselho da República, que poderá ser invocado e se tornar o fórum para uma repactuação política. Previsto na Constituição, todos os integrantes são membros do Executivo e do Legislativo ou indicados por quem detenha votos, sem risco de apropriação pelas corporações do Estado ou pelo Partido do Judiciário.
Integram o Conselho:
•          O Vice-Presidente da República
•          O Presidente da Câmara dos Deputados
•          O Presidente do Senado Federal
•          O Líder da Maioria na Câmara dos Deputados
•          O Líder da Minoria na Câmara dos Deputados
•          O Líder da Maioria no Senado Federal
•          O Líder da Minoria no Senado Federal e o líder do Congresso, sendo nomeado pelo órgão constituinte.
•          O ministro da Justiça
•          6 cidadãos brasileiros natos, com mais de 35 anos de idade, sendo 2 nomeados pelo Presidente da República, 2 eleitos pelo Senado Federal e 2 eleitos pela Câmara dos Deputados, todos com mandato de três anos, vedada a recondução.

Ponto 4 – Ciro os novos blocos de poder

O ponto central é quem irá para o 2º turno e como montar um novo pacto de governabilidade. Com a fragmentação partidária, o 1º turno das eleições será uma confusão só.
Se tivesse uma bússola menos descontrolada, porta estaria aberta para Ciro Gomes. Ele tem algumas vantagens relevantes, especialmente para a atual quadra da história:
  • É afirmativo, às vezes até em excesso;
  • Tem uma ótima percepção sobre políticas públicas, com noção clara sobre as complementaridades Estado-iniciativa privada, papel das políticas sociais, da educação.
  • Tem um projeto nacional, em consonância com os desenvolvimentistas históricos e com os segmentos industriais.
  • Tem noção clara sobre o excesso de poder de corporações e mídia.
  • Empunhou desde cedo a bandeira da anticorrupção contra o PMDB e o PSDB.
  • Não foi envolvido em escândalos até agora.
  • Tem histórico de lealdade com os governos aos quais serviu, incluindo o de Lula.
Seu problema é mirar vários alvos simultaneamente e acabar se enrolando nas suas estratégias.
  • Para não perder a onda anticorrupção, costuma endossar a Lava Jato e os julgamentos do TRF4.
  • Ao mesmo tempo, sabe que Lula tem sido alvo de perseguição política por parte do Judiciário. Costuma se enrolar tendo que defender Lula, sem se expor ao pensamento monofásico dos punitivistas.
  • Apesar do seu histórico nos governos petistas, não quer se contaminar junto às camadas antipetistas da população. Quer representar o gestor moderno, que o PSDB sempre prometeu a seus leitores, sem nunca conseguir entregar. E está fugindo do PT como o diabo da cruz.
E aí entra em uma sinuca.

Ponto 5 – os dilemas de Ciro

As guerras políticas dos últimos anos, estratificaram dois blocos antagônicos: de um lado, o petismo baleado; do outro, Judiciário, Ministério Público, estamento militar, mídia e grupos empresariais, tendo em comum apenas o antipetismo mais visceral – que, aliás, serviu de álibi para a implantação do Estado de Exceção.
O novo presidente terá que montar um novo pacto, romper com a polarização e ter energia suficiente para enquadrar os recalcitrantes.
Ciro conta com a possibilidade de, indo para o 2º turno com um candidato de direita (Bolsonaro ou Alckmin), a esquerda petista não ter outra alternativa senão a de votar nele.
A questão é chegar ao 2º turno. E Ciro anda criando problemas de graça para sua candidatura.
Tempos atrás, teve oportunidade de fechar uma dobradinha com Fernando Haddad – este, de vice. Seria o time dos sonhos para as esquerdas e os desenvolvimentistas. Para fora, Ciro fazendo política e recompondo a base de aliança para garantir a governabilidade. Para dentro, Haddad suprindo um dos grandes problemas de Ciro: a falta de paciência com os movimentos sociais e os sindicatos. E administrando o dia a dia dos planos de governo.
Como nem Haddad, menos ainda Ciro, podem ser confundidos com o petismo tradicional – aquele que tira o sono da classe média -, seria uma maneira de ampliar as alianças sem jogar fora o acervo precioso do lulismo.
Mas, ao que tudo indica, Ciro está abrindo mão dessa possibilidade de receber parte do legado de Lula.
Com a proliferação de candidaturas, corre o risco de não passar para o 2º. O ex-Ministro Joaquim Barbosa deverá repartir com ele a colheita da anticorrupção.
Lula está francamente contrariado com sua falta de solidariedade.
No palanque de São Bernardo, os elogios que Lula fez a Guilherme Boulos, do PSOL, apresentando-o como o novo na política, foi uma forma indireta de cutucar Ciro.
Da parte de Haddad, sua presença discreta no palco foi decisão pessoal, para não parecer estar explorando politicamente uma tragédia política, como ocorreu com os funerais de Eduardo Campos. Mas sua posição é de total acatamento do que Lula determinar. Se quiser que seja candidato a presidente, será; se quiser que se apresente como vice de Ciro, irá; se quiser que se candidate a Senador, se candidatará.
Esses são os dados que deverão ser jogados até fins de maio, quando será dada a largada para as elelições.

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